domingo, 30 de setembro de 2007

Oliveiroa - Finisterre

Despertei às 5h45' para preparar as coisas já que no dia anterior tinha dormido mais tarde.. eu estava no primeiro piso da casa e escutava o barulho do vento como se quisesse abrir todas as portas e janelas da casa.. impressionante! desci para o banheiro mas a curiosidade de ver como estava o tempo foi mais forte e abri a porta da casa.. surpreendentemente, chovia pouco e ventava menos do que parecia..

Saímos pelas 6h40' e pegamos a chuva desde o início do Caminho.. sugeri que fôssemos pela estrada e não pelos bosques nos primeiros dois quilômetros, pois poderíamos nos perder na imensa escuridão sem consegui enxergar as flechas com a chuva e vento atrapalhando.. já víamos mas não escutávamos vários raios.. e caminhar naquela chuva significava perigo: caminhar próximo de árvores e ainda com dois bastões de alumínio seriamos mesmo potenciais peregrinos-pára-raios ;).. por outro lado, os meninos (Charlie e Martica, pois o David ficou dormindo..), ficaram reticentes por causa do vento que faria na estrada e do perigo dos automóveis..


Para completar, quando saímos do albergue, não sabíamos em que direção estava o Caminho.. informação básica que peregrinos experientes como nós deveriam saber ou buscar na noite anterior.. após uns 200 ou 300 m, passou um carro e perguntei ao motorista onde estava o Caminho.. ele foi bastante simpático e nos informou que a estrada estava logo adiante e que para tomarmos o Caminho deveríamos voltar ao albergue e seguir na outra direção.. decidimos, então, seguir pela estrada mesmo.. ou seja, o acaso nos guiado para a estrada..

A chuva fina continuava e não incomodava muito.. contudo, quando deixamos a cidade e as ruas protegidas do vento pelas casas, sentimos a força das rajadas de vento.. seguimos com atenção aos carros, sinalizando com as lanternas, e cada vez mais encharcados com a chuva contínua que mudava sempre de direção de acordo com o vento.. passamos por um bar que tinha uma placa (em inglês) informando que o próximo bar estaria a 15 km dali.. já tínhamos caminhado quase 4 km e pensei ser uma publicidade enganosa para estrangeiros (como tinha visto antes em Burgos).. também vi no mapa que levava ao pescoço que haveriam povoados pelo Caminho..  1 km depois, passamos pelo cruzamento onde o Caminho bifurcava para Muxía ou Finisterre.. eu estava crente que deveria seguir pela direita, mas as setas indicavam o contrário.. ali percebi que eu estava errado, pois o mapa não tinha a parte final até Finisterre (ou Muxía).. eu apenas tinha deduzido (erradamente) que o Cabo Finisterre ficava mais a norte que Muxía.. Neste momento, percebemos que o aviso do bar poderia ser mesmo verdadeiro e que poderíamos ficar sem comida quente durante mais 15 km.. e só chovia e chovia.. tivemos que ponderar se estávamos em boas condições e preparados com alimentos e água.. certificamos que as barras energéticas, frutos secos e chocolate dariam pra todos e decidimos "arriscar" adiante.. na chegada a Burgos, eu já tinha caminhado 20 km em jejum, então sabia que poderia aguentar.. era nosso último dia de Caminho e algo me dizia que não estaríamos naquela situação durante todo o dia, como no dia anterior..

No entanto, logo o dia ficou mais tenebroso com a chuva que não parava, e o frio que aumentava paulatinamente.. e ficamos naquele pesadelo por mais 6 km, quando os primeiros raios de Sol surgiram em nosso dia.. pelas nove e pouco da manhã.. e com a luz do dia também veio mais uma certeza: de que não há tempestade, sem bonança.. e para nós, isso ocorreu "literalmente" :)


Dali em diante o Caminho foi um passeio..


Apesar da dureza das subidas e descidas, e da extensão daquela última etapa perfazendo um total de 35 km..

Assim que acabou a chuva, começamos a escutar o barulho do mar e logo depois o vimos pela primeira vez.. desse ponto em diante, o Caminho ficou ainda mais bonito sempre servido com o mar ao lado.. o mesmo mar que representava o fim do mundo conhecido na Idade Média..

Na chegada em Finisterre, decidi seguir o Caminho pela praia.. eu já vinha sozinho há algum tempo e foi uma sensação muito boa chegar pela areia da praia.. também me dei conta que estava terminando o Caminho como o comecei: nos primeiros treinos, fiz algumas caminhadas pelas praias do Algarve em Portugal.. em especial, uma insólita viagem de quase 18 km entre Olhos d'Água e a Ilha de Faro, narrada no início desse blogue.. a grande diferença foi a sensação de chegada: naquele treino, foi cheia de percalços, enquanto que agora, tinha gosto de regozijo e glória.. 





Para encerrar com chave de ouro, ao acercar-me da cidade, vieram duas peregrinas em minha direção e começaram a bater palmas ao me verem suado, só de bermuda e blusa, enquanto elas estavam cheias de casaco e frio.. sorri e também aplaudi a elas..

Muitos peregrinos fazem esta parte do Caminho de ônibus ou carro alugado.. também vale a pena, mas não é a mesma coisa.. afinal, como dizia o aviso no refúgio de Manjerin:

no pain, no glory” ;)


E melhor recepção à Costa da Morte que aquela não poderia pedir nem imaginar!

R

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